Vacina: saúde, direito e cidadania.

A Constituição cidadã prevê diversos direitos assegurados a todos os cidadãos, para a garantia de uma vida digna, apta a proporcionar ao ser humano tudo o que ele precisa para sobreviver. São garantias direcionadas ao direito à vida e, não menos importante, o direito à saúde.

O direito à saúde é assegurado a todos e constitui dever do Estado, sendo um direito fundamental social e que visa a redução do risco de doenças e de outros agravos, bem como prover acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

Convém frisar que tal garantia é um dos principais componentes da vida, seja como pressuposto de existência, seja como respaldo para qualidade de vida. E, em face de sua relevância, o direito à saúde possui a proteção constitucional no direito brasileiro como um direito fundamental, integrante dos direitos sociais, cuja aplicação deve ser garantida pelo Estado.

E neste momento em que o mundo e o Brasil passam pela pandemia da Covid-19, a pauta do dia está focada na vacina para combater esta doença. Mas são muitos os debates e as dificuldades que precisam ser superadas para salvar vidas.

O Brasil possui o Programa Nacional de Imunização (PNI), que foi criado em 1973, uma ação coordenada pelo Governo Federal, com o objetivo de controlar, eliminar e ou erradicar as doenças imunopreveníveis, mediante ações sistemáticas de vacinação da população. E tem tido papel destacado na consolidação de uma das principais e mais relevantes intervenções em saúde pública, com a conquista de resultados importantes, como a certificação de área livre da circulação do poliovírus selvagem, a eliminação da circulação do vírus da rubéola e pelo importante impacto na redução dos casos e mortes pelas doenças imunopreveníveis.

As vacinas são utilizadas para proteger o corpo humano. Permitem que o sistema imunológico combata vírus e bactérias que desafiam a saúde pública. Febre amarela, poliomielite, gripe, sarampo, rubéola, rotavírus, coqueluche, meningite, tuberculose e hepatites compõem o calendário de vacinação brasileiro, com oferta gratuita de imunização pelo Sistema Único de Saúde (SUS) através das unidades básicas de saúde em todo o país.

A vacinação não beneficia somente a pessoa que recebeu a dose. Com a diminuição da circulação dos vírus e bactérias que causam as doenças, a vacina beneficia a população como um todo – incluindo aquelas pessoas que tenham algum tipo de restrição ao uso da vacina, como alergias ou doenças imunes, e até recém-nascidos. Exemplo de êxito da imunização, a varíola se tornou a primeira doença erradicada do planeta. Anteriormente, a doença, capaz de matar cerca de 30% dos infectados, dizimou boa parte da população do Rio de Janeiro no início do século 20.

No caso da vacina contra a Covid-19, a ciência tem acelerado muito os estudos para que seja possível a produção de vacinas eficazes e seguras para enfrentar esta doença.

Mas são muitos os gargalos que o Brasil precisa responder com ações concretas para atuar efetivamente no atendimento dessa demanda, em específico. Citamos, por exemplo:

  1. Demora na aprovação das vacinas. Segundo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), até este momento, nenhum fabricante fez solicitação de autorização emergencial ou mesmo registro;
  2. Atraso nas encomendas: O governo federal só recentemente iniciou a busca de compra de vacinas e apresentou um plano de vacinação que não contempla as diretrizes, estratégias e ações de curto, médio e longo prazos para que a imunização atinja toda a população brasileira;
  3. Falta de capacidade de produção: O governo federal não tem fomentado devidamente o complexo industrial da saúde;
  4. Dificuldades logísticas: O imunizante Oxford-AstraZeneca, base do programa do governo federal até o momento, pode ser armazenado em refrigeradores normais, entre 2 e 8 graus Celsius. Isso permite que seja facilmente usado na estrutura já construída para o Programa Nacional de Imunização brasileiro. O país, porém, pode ter dificuldades com as doses cuja compra negocia com a Pfizer, por falta de estrutura adequada de ultracongelamento em boa parte do país;
  5. Número de doses aplicada: ainda não há discussão sobre isso;
  6. Recusa em se vacinar: A recusa à vacina no Brasil está crescente. Em pesquisa nacional do Datafolha, divulgada em dezembro/2020, o percentual de brasileiros dispostos a se vacinar contra a Covid-19 caiu de 89% na primeira quinzena de agosto para 73% em dezembro, e no mesmo período cresceu de 9% para 22% a parcela de pessoas que declaram que não querem tomar a vacina. Há ainda 5% que preferiram não opinar. Imagina-se que tais resultados estão diante da disseminação de informações falsas, além de campanha, por parte de governantes, que desencoraja a vacinação e dificultam o combate à pandemia;
  7. Financiamento: Se faz necessário a revogação de EC 95, que entre 2018/2020 implicou em menos R$ 20 bilhões aplicados na saúde. Mas também a necessidade por novos créditos e reformas, como tributária no país.

Ressalta-se que se faz necessário que as autoridades sanitárias do país e o Poder Legislativo tomem providências efetivas para assegurar o acesso à vacina e que esta proteção não seja apenas para poucos. O governo federal deve trabalhar com uma diversidade de vacinas, que tenham comprovação de eficácia e segurança, atendendo a complexidade logística do território nacional e as especificidades dos usuários. A saúde é um bem universal e um direito constitucional. Durante a pandemia de Covid-19, fica nítida a importância desses princípios.

E num cenário de grave crise sanitária e social, espera-se que o setor privado atue de forma complementar as ações e serviços do SUS. Mas o que temos visto é a corrida pelo lucro: a produção das vacinas com a detenção das patentes e o comércio de olho para vender os serviços de aplicação destas vacinas. Tais atitudes violam o direito à saúde, aumentando as desigualdades e custar milhões de vidas. O que precisamos que aconteça é  a simplificação do dispositivo legal da Licença Compulsória (conhecida como quebra de patentes), a exemplo de outros países, permitindo que o Brasil tenha acesso rápido às respostas mais efetivas contra a pandemia, protegido de preços exorbitantes e descabidos das grandes corporações, em especial da indústria farmacêutica e, em especial, as farmácias sejam uma unidade de prestação de serviços destinada a prestar assistência farmacêutica e assistência à saúde, integradas ao SUS.

Ainda destacamos que conquistamos o controle social do SUS. E, portanto, precisamos acompanhar e principalmente participar dessa instância de participação da comunidade. E os governantes devem fazer a escuta dessas vozes, que expressam o debate e a construção coletiva por dias melhores.

Assim, algumas das questões citadas acima vem sendo, inclusive, debatidas pelo Conselho Nacional de Saúde e o qual tem divulgado diferentes instrumentos rumo a defesa das vidas. Estes documentos, além de indicarem as dificuldades e problemas, elencam as ações necessárias para que o governo cumpra com seu dever constitucional para com a população brasileira. Você pode conhecer estas proposições pelo link http://www.susconecta.org.br/ e mesmo conhecer as divulgações realizadas pelo Conselho Estadual de Saúde (CESRS), http://www.ces.rs.gov.br/inicial, ou buscar o contato do Conselho Municipal de sua cidade.

Diante das linhas gerais expostas neste texto não há dúvidas que vacina é saúde, um direito e exercício de cidadania!