Veto à ultratividade beneficia patronato e ameaça conquistas da classe trabalhadora

O presidente Bolsonaro vetou a ultratividade dos acordos e convenções coletivas de trabalho ao sancionar a Lei 14.020/2020 (em que se transformou a Medida Provisória 936) que permite a redução de salários e jornada durante a pandemia do coronavírus e foi aprovada recentemente pelo Congresso Nacional. “Os trabalhadores serão duramente afetados”, afirmou o advogado Magnus Farkatt, assessor jurídico da CTB.

A ultratividade, com vigência até 31 de dezembro, foi incluída na MP por sugestão das centrais sindicais acatada pelos parlamentares. Era uma garantia de que enquanto persistir a pandemia os benefícios previstos em convenção ou acordo cujo prazo se esgota por essas dias críticos serão mantidos.Riscos para as categorias“Na verdade é muito difícil mobilizar as categorias para negociar acordos e convenções coletivas durante a pandemia”, comentou Farkatt. “O máximo que se consegue nessas condições é uma mobilização circunscrita às redes sociais, que são limitadas e reduzem o poder de pressão da classe trabalhadora”.

Como consequência prática, “é muito provável que as categorias fiquem sem acordo e convenção em função dessas dificuldades”, agrega o assessor da CTB. Ele lembra que a ultratividade é prevista também na MP 927, que tramita no Senado, mas como uma dádiva do empregador.

Alternativas

Uma alternativa do movimento sindical será recorrer ao Poder Judiciário, ponderou o advogado, embora até esta via seja complicada porque o TST tem jurisprudência consolidada estabelecendo que a instauração de dissídio coletivo de natureza econômica está condicionada a comum acordo entre patrões e empregados. Mesmo assim, é uma alternativa que terá de ser pensada e explorada.

O veto também pode ser derrubado pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal em sessão conjunta no prazo de 30 dias a partir da publicação da lei. Isto requer maioria absoluta, o que significa 257 votos na Câmara e 41 no Senado. Não é tarefa fácil, mas o movimento sindical tem que pressionar o Parlamento e trabalhar neste sentido.

Vetos

Além da ultratividade, Bolsonaro vetou outros itens da nova lei. Veja:

  • artigo 9º, parágrafo 1º, inciso VI, alíneas b, c e d: ampliava o rol de hipóteses de exclusão de incidência tributária. Pela justificativa, o artigo vai contra a Constituição Federal, que veda instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos;
  • artigo 17: nesse trecho o presidente alegou que o artigo contrariava o interesse público, que o veto visa incentivar a negociação, a valorização da autonomia das partes e a promoção do desenvolvimento das relações de trabalho;
  • artigo 27: previa que o indivíduo desempregado, sem direito ao seguro-desemprego, obtivesse pagamento de três parcelas no valor de R$600. Segundo a justificativa, o benefício viola o artigo 113 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT);
  • artigo 28: segundo justificativa do Planalto, contrariava o interesse público por conferir tratamento distinto entre os diversos tipos de desempregados de forma injustificada, apenas considerando os que receberam a última parcela de seguro desemprego entre março e abril;
  • artigo 30: de acordo com o feto, o artigo viola o princípio democrático e do devido processo legislativo;
  • artigos 32 e 37: segundo o veto presidencial, os trechos abarcavam matéria estranha e sem a necessária pertinência temática estrita ao objeto original da medida provisória submetida à conversão, violando o princípio democrático e do devido processo legislativo, bem como acarretavam renúncia de receita, o que violava o artigo 113 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), a Lei de Responsabilidade Fiscal, bem como a Lei de Diretrizes Orçamentárias para 2020;
  • artigos 33, 34 e 36: de acordo com a justificativa do Planalto, os dispositivos elevavam um ponto percentual da alíquota da Cofins-Importação e se relacionava diretamente ao artigo 33, que prorrogava a vigência da contribuição previdenciária sobre receita bruta, tendo em vista a necessidade de equivalência de tratamento entre produtos nacionais e importados. Acarretariam renúncia de receita sem o cancelamento equivalente de outra despesa obrigatória e sem que esteja acompanhada de estimativa do seu impacto orçamentário e financeiro, o que também viola o artigo 113 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), o artigo 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal, bem como o artigo 114 da Lei de Diretrizes Orçamentárias para 2020;
  • artigo 35: o trecho previa que os débitos trabalhistas em sede, convenção ou acordo coletivo, sentença normativa ou cláusula contratual, seriam atualizados monetariamente com base na remuneração adicional dos depósitos de poupança (Taxa Referencial). Pela justificativa, os artigos contrariavam o interesse público por estar em descompasso e incoerente com o sistema de atualização de débitos trabalhistas consolidado por intermédio do artigo 879, parágrafo 7º, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).Fonte: CTB
    Publicado em 09/07/2020